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quarta-feira, 24 de maio de 2023


 XII


Esticar os braços e não chegar
entorpecemos como os gigantes de Papini no jardim
onde a muralha de Camelot se desfaz ao suspiro
extinto no Cristo vermelho por Lovis Corinth
religioso no diário louco em Gogol
Penitência de Canossa que se impõe
pómulos sem algodão 
arroz como inquietas suricatas no Kalahari
o fundo do tacho raspado como os lares desta República Platónica
presos a uma Atlântida afundada
esta é a água que se agita sem sentido 
depressão nos charcos de suor em Arcádia
o amrita a escorregar das garras que Paracelso encravou
salta Hanuman para o clube dos poetas mortos
Miguel de Molinos nos membros agarrados à Morte inquieta
abraço venenoso para um Laocoonte que vê a cilada na existência
enquanto Goya esvai fuzilamentos pelas orelhas de Maio
onde o calor é mais intenso perto da luz que ilumina os mortos.




Miguelsalgado, AQUERONTE

quarta-feira, 10 de maio de 2023


Rosa Luxemburgo:


Sou com algemas: sacudo braços nos braços de empregados que magoam. Estou sem palco: apelar à paz é lançar a guerra. Ombros largos dissolvidos pela prisão umbrosa, clavículas com arte a dispersarem-se como migalhas sopradas: pessoas de partido igual afastam-se porque sim. Nunca mais a mão passará no pêlo do gato sossegado: para onde vou de mordaça? Querem o meu suor nas escadas como se não mancasse. Estou sem protesto: as pulsações a morrer às mãos de empregados que magoam. Sou para a necrópole: o que ainda podia ser já não será. Matamo-nos uns aos outros como anjos. A paz é sempre podre. Onde caio é feio: bonecas sem pernas e lodo poluído como manta.



Miguelsalgado, AQUERONTE