Mário Dias Ramos - "O Logro" (1999)
Na realidade, esta obra do escritor Mário Dias Ramos foi editada pela primeira vez em 1963 e esta publicação mais recente é uma segunda edição, uma edição especial pela editora Dafnis (que creio já não existir) e com texturas, imagens, fotografias, de Miguel Louro, num estilo bem escuro, naturalmente em sintonia com o carácter do texto. Aliás, é até estranho que o livro tenha escapado incólume pela censura da época. Pelo menos não vi nada em sentido contrário.
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“…caímos num poço devasso e profundo, negro e repulsivo. O empregado traz-nos um café tão preto como a sua existência servil e angustiada. À nossa volta caras hostis afundam-se em jornais abertos com colunas de notícias que mentem num esgar de compromisso pactuante. O fiscal observa a ordem do serviço. Uma multidão entra e sai, apressadamente, com um ar indefinido no rosto. Intelectuais dissolutos olham-se na penumbra de um horizonte que se fechou hermeticamente. Um sol que brilha falso e não aquece os homens, envolve este ambiente de insalubridade mental e irreconciliação humana. Entretanto, nada sucede. Os homens nascem e morrem e, de um estado ao outro, a velocidade é a mesma do som. Nascem e morrem sem dar quase por isso…”